Pessoas com maior paz de espírito conseguem regular melhor as emoções?

Pessoas com maior paz de espírito conseguem regular melhor as emoções?

Investigação revela que pessoas com níveis mais elevados de paz de espírito são melhores a reinterpretar situações de modo a regularem as suas emoções, em vez de as suprimirem.

O bem-estar mental (ou felicidade) tem sido objeto de vários estudos nas últimas décadas e é agora reconhecido como abrangendo duas dimensões distintas: o bem-estar hedónico (caracterizado pela presença de emoções positivas, pela ausência de emoções negativas e pela satisfação com a própria vida) e o bem-estar eudaimónico (marcado pelo crescimento pessoal, mestria e vida com significado e propósito). No entanto, até recentemente, a paz de espírito (PdE) – uma forma de bem-estar caracterizada pela paz e harmonia internas – tem recebido muito pouca atenção.

Nas culturas orientais, a paz e a harmonia internas são consideradas fundamentais para o bem-estar. Um estudo piloto de Lee et al. (2013), envolvendo participantes chineses, revelou que a PdE estava positivamente associada à satisfação com a vida e às emoções positivas, e negativamente correlacionada com emoções negativas, depressão e ansiedade. Mas também nas culturas ocidentais as pessoas pensam que ter PdE é crucial para o seu bem-estar. Por exemplo, Sikka et al. (2018) replicaram as descobertas referidas acima num grupo de participantes ocidentais e mostraram adicionalmente uma ligação positiva entre a PdE e o bem-estar eudaimónico.

A questão crítica é saber porque é que alguns indivíduos têm mais PdE do que outros, ou seja, o que está na base das diferenças individuais na PdE. Embora se saiba que diferentes processos psicológicos podem estar envolvidos, décadas de investigação mostraram que um fator importante que explica diferentes aspetos do bem-estar e do mal-estar é a regulação das emoções. Surpreendentemente, até agora nenhum estudo examinou especificamente a relação entre a PdE e a regulação das emoções.

Para preencher esta lacuna, Pilleriin Sikka e colaboradores realizaram dois estudos na Finlândia e nos EUA, com 417 e 303 participantes respetivamente, tendo avaliado a PdE das pessoas, as estratégias de regulação emocional que normalmente utilizam e outros aspetos do bem-estar e do mal-estar.

Os resultados mostraram que as pessoas com níveis mais elevados de PdE apresentaram maior tendência para utilizar a estratégia de reavaliação cognitiva, ou seja, reinterpretar situações de modo a regular as suas respostas emocionais (reenquadrar uma situação que provoca ansiedade, como fazer um exame ou uma entrevista de emprego, encarando-a como uma oportunidade para mostrar o conhecimento e o trabalho árduo), e menor tendência ao uso de supressão emocional, ou seja, esconder ou não expressar emoções (tentar não mostrar o quanto se sente ansioso/a).

No artigo “Individual differences in peace of mind reflect adaptive emotion regulation”, publicado na revista científica Personality and Individual Differences, os investigadores da Universidade de Stanford (EUA), Universidade de Turku (Finlândia) e Universidade de Skövde (Suécia) não só demonstraram que pessoas com níveis mais elevados (versus mais baixos) de PdE tendem a usar estratégias de regulação emocional mais adaptativas, mas também que esta relação se generaliza em dois contextos culturais ocidentais diferentes.

Pilleriin Sikka, investigadora apoiada pela Fundação BIAL, sublinha que “a capacidade de regular as nossas emoções pode ser importante para termos mais PdE e, por isso, intervenções focadas no ensino de competências eficazes de regulação emocional podem ajudar a aumentar a PdE”.

Saiba mais sobre o projeto “Peace of Mind and Emotion Regulation: Survey-Based, Behavioural, and Neuroscientific Investigations” aqui.


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