Será que a cegueira afeta o modo como avaliamos se uma emoção é autêntica ou fingida?

Será que a cegueira afeta o modo como avaliamos se uma emoção é autêntica ou fingida?

Uma equipa de investigação avaliou a perceção de autenticidade emocional de risos e choros em participantes que nasceram ou ficaram cegos numa fase precoce da vida e em participantes que perderam a visão numa fase mais tardia. Os resultados indicaram que os participantes que se tornaram cegos mais tardiamente tiveram pior desempenho na avaliação da autenticidade emocional.

O ser humano pode expressar espontaneamente as suas emoções, como rir e chorar, mas pode também regulá-las e controlá-las voluntariamente. Saber diferenciar quando as expressões emocionais são autênticas ou simuladas é uma competência social importante para todos, mas ainda mais determinante para as pessoas cegas, uma vez que não podem usar pistas de linguagem facial e corporal, baseando a sua perceção apenas em pistas vocais.

Para aferir se a perda de visão afeta a capacidade dos cegos de interpretar as emoções e intenções dos outros, tendo em conta que precisam frequentemente de confiar noutras pessoas para apoio na sua vida quotidiana, Tatiana Conde e equipa realizaram um estudo, com o apoio da Fundação BIAL, para analisar como pessoas com deficiência visual percecionam a autenticidade emocional.

No artigo Blindness influences emotional authenticity perception in voices: Behavioral and ERP evidence, publicado na revista científica Cortex, os investigadores da Faculdade de Psicologia da  Universidade de Lisboa (PT) e do University College London (UK) explicam que usaram uma combinação de medidas comportamentais e potenciais evocados por eventos (em inglês: event-related potentials, ERP), para avaliar a perceção de autenticidade emocional de risos e choros em 51 participantes: indivíduos que nasceram ou ficaram cegos numa fase precoce da vida (n = 17), numa fase tardia (n = 17), bem como um grupo de controlo de normovisuais (n = 17).

Todos os participantes realizaram duas tarefas enquanto os dados EEG eram registados. Numa das tarefas os participantes foram instruídos a discriminar a autenticidade emocional dos estímulos e na outra tarefa a discriminar a emoção (tristeza vs. alegria). Os estímulos consistiram em risos e choros forçados ou autênticos. A análise do ERP centrou-se em três componentes: N1, P2 e positivo tardio (late positive potential - LPP). Estes componentes de ERP refletem diferentes estádios de processamento de informação emocional vocal relacionados com processamento sensorial precoce (N1), deteção de saliência (P2) e avaliação cognitiva (LPP).

Os resultados demonstraram que, comportamentalmente, os participantes com cegueira precoce mostraram uma perceção intacta da autenticidade, ao contrário dos participantes com cegueira tardia, que tiveram um desempenho pior do que o do grupo de controlo. Não se registaram diferenças entre os grupos na tarefa de discriminação das emoções.

Nas respostas cerebrais, todos os grupos foram sensíveis à autenticidade do riso no estádio P2 e à autenticidade do choro no estádio inicial do LPP. No entanto, apenas os participantes com cegueira precoce foram sensíveis à autenticidade do choro nos estádios N1 e intermediário do LPP, e à autenticidade do riso no estádio inicial do LPP. Além disso, os participantes com cegueira precoce e os normovisuais foram mais sensíveis do que os com cegueira tardia à autenticidade do choro nos estádios P2 e LPP tardio.

“Estes resultados sugerem que a privação visual prolongada com início tardio deteriora a perceção de autenticidade emocional”, afirma Tatiana Conde, contrapondo que “a privação visual precoce parece potencialmente trazer benefícios a nível de capacidades auditivas complexas”.

Saiba mais sobre o projeto “148/18 - Voice perception in the visually deprived brain: Behavioral and electrophysiological insights” aqui.


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